Discurso do Primeiro Ministro proferido na sessão ordinária de 22 de janeiro de 2025, durante o debate sobre "Proteção e Aprimoramento da Democracia e da Boa Governança".
Senhor Presidente da Assembleia Nacional
Senhoras e Senhores Membros do Governo
Senhoras e Senhores Deputados
Cabo Verde tem trilhado um percurso exemplar que confere ao País credibilidade e reconhecimento enquanto Estado de Direito Democrático Constitucional.A nossa democracia é frequentemente elogiada a nível internacional.
Contudo, é essencial reconhecer que este sucesso não deve levar à complacência.
Vivemos num mundo interconectado, marcado por crises complexas e desafios globais interdependentes a nível económico, climático, securitário e geo-político.
Apesar dos constrangimentos impostos por contextos externos exigentes, Cabo Verde manteve-se fiel aos seus compromissos centrais: a valorização da democracia, o combate à pobreza e o percurso para o desenvolvimento sustentável. Fizemo-lo protegendo os pilares estruturais da nossa sociedade – as liberdades individuais, as instituições democráticas e o Estado de Direito.
E, este é o caminho certo que Cabo Verde deve prosseguir: alcançar o desenvolvimento sustentável em democracia, com boa governança e respeito pela dignidade humana.
Senhor Presidente da Assembleia Nacional
Senhoras e Senhores Deputados
Vivemos na era das Redes Sociais, da Inteligência Artificial e da expansão da Pós-Verdade.
Estas ferramentas são usadas com intencionalidade para manipular a perceção de cidadãos, criar milhares e milhões de seguidores e praticantes de ideologias populistas, extremistas, anti-políticos e negacionistas, disseminadas à distância de um clic, com desprezo por factos, evidências científicas, valores e princípios éticos.
Na ausência de qualquer mecanismo de regulação e de responsabilização, em nome da liberdade de expressão, as redes sociais e a inteligência artificial são usadas para violar normas constitucionais de limitação da liberdade de expressão e de informação.
No caso da Constituição de Cabo Verde, esse limite existe quando a liberdade de expressão e de informação “ofende a honra e a consideração das pessoas, viola o seu direito à imagem ou à reserva da intimidade da vida pessoal e familiar e faz a apologia da violência”.
A mercantilização do voto e o condicionamento financeiro de pessoas mais vulneráveis na sua liberdade de escolha nos momentos eleitorais, são uma ameaça à democracia.
Quando se instalam em ambientes de impunidade, levam à sua aceitação e normalização como parte da regra do jogo, tornando o sistema democrático presa fácil para populistas, autocratas e seus financiadores. Isto existe em muitos países em desenvolvimento e não só.
A falta de confiança nos sistemas eleitorais e nos seus mecanismos de apuramento da verdade eleitoral, ataca o coração da democracia. Este, felizmente, não é o caso de Cabo Verde!
Este contexto perturbador que está acontecendo em várias partes do mundo, é composto por ameaças reais à democracia e à subversão das suas regras de liberdade a que nenhum país está imune.
Apesar da robustez da nossa democracia, ela não está imune às ameaças contemporâneas assentes em fenómenos que, ao polarizarem as sociedades e ao semearem a desconfiança dos cidadãos nas instituições públicas, representam riscos concretos que exigem respostas estratégicas, inovadoras e consensuais.
Senhor Presidente da Assembleia Nacional
Senhoras e Senhores Deputados
O propósito deste debate é um apelo a esta Casa Parlamentar para que, juntos, assumamos a responsabilidade de proteger e fortalecer a democracia cabo-verdiana através de consensos que reforcem a integridade do sistema democrático e a confiança dos cidadãos nas instituições da República.
Um bom passo nesse sentido, é a institucionalização de um debate parlamentar anual sobre o Estado da Democracia Cabo-verdiana, com recurso a indicadores credíveis de desempenho das instituições democráticas e audição prévia da Academia, especialistas e representantes das Organizações da Sociedade Civil para a construção de compromissos políticos orientados para a defesa e aprimoramento da nossa democracia.
O combate à desinformação, ao fake news e à ideologia da pós-verdade aumenta a pertinência e a necessidade de termos órgãos de comunicação social públicos que se guiem por programação e informação orientadas pelos princípios constitucionais da liberdade e da independência dos órgãos e dos jornalistas, mas também pelos princípios do pluralismo, rigor e imparcialidade.
Ganha também maior pertinência, a necessidade de regulação da atuação das plataformas digitais e da Inteligência Artificial e a promoção dos valores da tolerância, da responsabilidade cívica e o reforço da literacia mediática e digital, particularmente junto dos jovens.
A justiça é um pilar importante da democracia e da boa governança. Muitas das reformas são suportadas por leis que exigem maioria qualificada no Parlamento.
É preciso reforçar a atitude de compromisso parlamentar para que as reformas se façam em condições e ambientes que garantam a perenidade das soluções estruturantes, naturalmente aperfeiçoadas quando necessário, para melhorar a qualidade da justiça e a confiança dos cidadãos na justiça.
Temos todos a responsabilidade de melhorar o nosso sistema eleitoral. Saudamos o facto de termos – o Governo e os Deputados – iniciado o processo de revisão do Código Eleitoral.
Temos todos a responsabilidade de evitar que órgãos externos ao Parlamento, fundamentais ao bom funcionamento da nossa democracia e à boa governança, ultrapassem significativamente o término dos seus mandatos, fiquem com composição incompleta ou sem funcionalidade devido a dificuldades em conseguir consensos nas eleições desses órgãos.
A Boa Governança nas suas componentes respeito pelo primado da lei, prestação de contas, responsabilidade e transparência, pode ser substancialmente melhorada com a transformação digital dos serviços do Estado, para além de reduzir o tempo e melhorar a qualidade do serviço prestado aos cidadãos e às empresas.
O Portal da Justiça já é uma realidade, o Portal Único de Serviços Públicos Digitais está em construção, assim como o Portal da Transparência aplicável à Administração Pública e às Câmaras Municipais.
Temos que reduzir os riscos associados ao financiamento dos partidos políticos. Estamos disponíveis a discutir os melhores mecanismos para aumentar o financiamento público dos partidos políticos para o seu funcionamento corrente e limitar despesas com as campanhas eleitorais.
Senhor Presidente da Assembleia Nacional
Senhoras e Senhores Deputados
Estamos perante um momento decisivo para preservarmos e aperfeiçoarmos o património comum que construímos neste país: a nossa democracia.
Devemos unir os esforços, num espírito de responsabilidade e compromisso, para que Cabo Verde continue a ser uma referência de estabilidade, progresso e respeito pelos valores fundamentais da democracia.
Temos esta responsabilidade acrescida, no ano em que comemoramos os 50 anos da indendência do país.
Muito obrigado.